domingo, 27 de setembro de 2009

BISPO DE NAMPULA – D. MANUEL VIEIRA PINTO
Factos que ficaram na memória.

Estávamos no ano de 1974. Dias antes da data histórica e libertadora do 25 de Abril, mais propriamente no domingo anterior. Eu era um simples operário metalúrgico do Arsenal do Alfeite. Residia em Almada, num quarto alugado. Era jovem, tinha 26 anos de idade e havia regressado quatro anos antes da guerra colonial na Guiné.
Nunca me havia confrontado com problemas políticos e posso até mesmo dizer que, apesar de alguma revolta interior por terem sido desperdiçados os anos da juventude, numa guerra que nada me dizia e da qual não se vislumbrava o final, o certo é que não desenvolvia qualquer actividade, contra ou a favor do regime existente. Limitava-me a trabalhar, na categoria de serralheiro mecânico, ganhando pouco mais de mil escudos, que mal davam para pagar o quarto, pagar as refeições e comprar alguma roupa a prestações. Tinha consciência de que minha mãe não me poderia valer pois também ela, garantia o seu sustento como trabalhadora rural.
As minhas distracções resumiam-se a um ou outro filme na Incrível almadense, numa ou outra ida a praia, na Caparica e a um passeio ou outro por Lisboa.
Era em Lisboa que tinha um amigo, que ainda o é hoje, e que periodicamente visita a minha casa em Alvalade. Esse meu amigo o José R. trabalhava num escritório de advogados enquanto estudava para ser solicitador, profissão que conseguiu e exerceu. Esteve também na guerra colonial, mas em Moçambique, mais propriamente em Nampula.
O José R. era católico praticante e frequentava a Missão Católica em Nampula, tendo-se tornado grande amigo dos padres e religiosas que ali desenvolviam a sua missão junto da população pobre e explorada de Moçambique. Igualmente aí conheceu o bispo de Nampula, D. Manuel Vieira Pinto, também ele um revoltado contra o sistema que escravizava o povo moçambicano.
Não sei se D. Manuel ainda é vivo, mas se o for, muito gostaria de lhe dar a saber este relato.
Pois, em determinada altura e pouco antes do 25 de Abril de 1974, D. Manuel Vieira Pinto foi expulso de Moçambique, veio para o continente onde ficou abrigado na residência de uma família abastada do Cartaxo.
Depois disso, uma das religiosas da Missão de Nampula, entendeu enviar ao meu amigo José R. uma carta, para o mesmo entregar directamente ao bispo de Nampula, pois se viesse pelo correio a PIDE, se encarregaria dela como seria óbvio.
O José R. telefonou-me e convidou-me a ir com ele ao Cartaxo, num domingo, precisamente aquele que antecedeu o 25 de Abril, para entregarmos a carta. Com as características próprias das nossas idades, não olhámos ao perigos e consequências e lá seguimos nesse domingo, manhã cedo, de comboio a partir de Santa Apolónia e até Santarém.
(continua)

1 comentário:

  1. Sim, D. Manuel Vieira Pinto está ainda vivo e em Portugal por razões da saúde. Doutro modo, estaria ele ainda em Nampula, Mocambique.

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