terça-feira, 29 de setembro de 2009

AS MINHAS MEMÓRIAS - O pó de arroz da minha irmã

O PÓ DE ARROZ DA MINHA IRMÃ
Que me desculpe a minha irmã, por colocar aqui esta história verdadeira, que devido ao longo tempo já passado desde a sua efectivação, poderá não ser tão verdadeira nos seus pormenores, mas o essencial aqui vai.
Quando fui para a Escola Oficial, já minha irmã, três anos mais velha a frequentava. E também ela ficou entregue aos cuidados de minha tia M. Teresa. A minha irmã sempre gostou muito de se aperaltar, para alem de gostar de fazer das suas. De tal forma, que, estando eu ainda no monte e ela já na Vila a frequentar a escola primária, durante os trabalhos de tiragem da cortiça, um dos trabalhadores, que pernoitava na Vila, a certa altura, foi por mim indagado nos seguintes termos:
-“ Você não conhece lá na Vila, a minha irmã?
Ao que o rapaz respondeu –“ não, não conheço!”
De imediato respondi : “pois olhe se você ver por aquelas ruas uma moça a correr, a correr, olhe é a minha irmã, porque ela é muito doida!”
E pronto na minha inocência estava feita a descrição da minha irmã.
Mas, como dizia enquanto frequentou a escola primária, a minha irmã, logo a principio, estava em casa de minha tia.
E a minha tia, trabalhadora rural, nos tempos do sol a sol, saía de casa muito cedo, para as herdades, onde trabalhava e angariava o seu sustento e da família. Vida de sacrifício, de exploração e atrevo-me a dizer, de escravidão. O meu tio, trabalhava então como sapateiro, na oficina de sapataria, existente na Rua do Posto, propriedade do Sr Garcia. O Sr Garcia contribuiu também em muito para o desenvolvimento de Alvalade, pois esta oficina era das maiores das redondezas e empregava vários operários. Infelizmente, Alvalade, esquece por vezes inadvertidamente estas pessoas que deixaram nome. Enfim!
E então os meus tios saíam para o trabalho e a minha irmã ficava na cama, até á hora em que iria para a escola creio que com minha avó. E, num desses dias, a minha tia, por esquecimento, deixou no quarto, uma caixa com DDT ( pó que servia para eliminar parasitas). A minha irmã, ao levantar-se,sem nada dizer à avó, tratou de fazer a sua “toilette”. E confundindo aquele pó, que ate não cheirava bem, com pó-de-arroz, polvilhou-se toda com o mesmo.
Resultado, foi para a escola e muito senhora do seu nariz, besuntada com o pó DDT. Naturalmente, quem solucionou a questão, deve ter sido a professora, que segundo creio, não posso afiançar, a Dª Judite.
A minha tia, quando regressou do trabalho, informada que foi, só lhe restou confirmar os factos, pois havia DDT espalhado por todo o lado.

AS MINHAS MEMÓRIAS - A minha ida para a Escola Primária

A MINHA IDA PARA A ESCOLA PRIMÁRIA

Antes de completar os sete anos, idade obrigatória para se ir para a escola oficial, minha mãe
mandou-me para a “escola paga”. A “escola paga” era uma espécie de pré-escolar, onde as crianças aprendiam as primeiras letras. Aí sob a orientação da Dª Inês, aprendíamos a escrever em ardósias, a soletrar as primeiras palavras, de forma que, quando ingressássemos na oficial, já íamos instruídos. Grande Senhora foi a Dª Inês, de seu nome completo Inês Faria Ramos, se não estou em erro.. Muito educada, com sentido de responsabilidade, ela ensinava as letras, mas também ensinava as crianças na sua educação. Falta a Alvalade, render homenagem póstuma a esta grande Senhora. A “ escola paga” também era conhecida pela “escola da Dª Inês” e funcionava na Rua de Lisboa. Pagava-se vinte e cinco tostões por semana, mas por vezes a Dª Inês fechava os olhos àqueles que por dificuldades económicas o não podiam fazer. A meio da manhã e a meio da tarde, havia o recreio, e quando o mesmo acontecia, aí iam os miúdos Rua de Lisboa abaixo, até ao Serro do Moinho. Aí brincava-se ao “apanhar”, faziam-se as necessidades fisiológicas, porque, casas de banho não as haviam. Eu ficava na casa de minha tia, meia-irmã de minha mãe.
Quando comecei a ir para a escola primária, de principio ia a pé, pela linha-férrea, e sozinho. Para mim que era um medricas, nem sei como conseguia percorrer os 5 km que distanciavam da sede da freguesia. O receio era enorme, mas lá me fui habituando. Mais tarde, a minha mãe decidiu que seria melhor, pernoitar em Alvalade, na casa da minha tia. E assim foi durante uns anos. Dormia na casa de minha tia e ia jantar numa hospedaria, que era duma senhora chamada Júlia Ramusga ( Peixeira).
Mais tarde compraram-me uma bicicleta a pedal e comecei a ir e vir do” monte” para a escola de bicicleta.

A PRIMEIRA PROFESSORA
Mas aos sete anos, entrei na escola primária. Lembro-me que logo pela manhã, no “monte”, a minha mãe acordou-me, lavou-me e vestiu-me para ir para a escola. Como a mesma tinha o seu início às nove horas, tive que me levantar por volta das sete horas, o que só por si fez com que em nada me agradasse a ideia. Ter que me levantar cedo todos os dias? Fosse de Inverno, com a geada a deixar os campos todos branquinhos, como se tivesse nevado, ou em dias de chuva, ou já no verão sob um sol escaldante. E lá fui para a escola, onde ingressei na 1ª classe. Foi minha primeira professora a Dª Maria Luísa Madeira, natural de Alvalade e que tinha fama de boa professora. Como já vinha preparado da escola paga da Dª Inês, não me foi difícil a aprendizagem e mostrei ser um bom aluno. Passei então a ficar todos os dias na Vila, em casa de minha tia, evitando assim a caminhada de cinco quilómetros que me separavam do monte. As aulas duravam todo dia, das 9 horas ao meio dia e das 13 h às 17 horas. Tanto de manhã como de tarde, havia um intervalo a meio de cada período.
A Dª Maria Luísa Madeira, tinha e ainda tem felizmente uma irmã, a quem ainda há poucos dias saudei. Uma grande amiga, e também muito amiga de Alvalade. Foi grato falar com ela há dias e ouvir da sua boca aquilo que deseja para Alvalade. Se conseguir arranjar força e ânimo, ainda darei o meu contributo para que a sua ideia seja realidade. Por enquanto é segredo.
Mas tive outras professoras, uma das quais não consigo lembrar-me o nome, sei que era casada com ferroviário e morava na estação da Cp.
Lembro-me que o nome era qualquer coisa com o apelido de Barreto. Foi minha professora na segunda classe e na mesma sala dava aulas aos “matulões” da quarta classe. Depois na terceira classe e na quarta classe foi minha professora uma senhora dos Foros de Vale de Lobo, Dª Maria Antónia Peixeiro. Não sei se estas duas últimas são vivas, nem onde residem caso isso se verifique.Eu entendo que os nossos professores ao longo dos anos, principalmente os da instrução primária, deveria ser alvo de homenagem. Mas… um homem sozinho não pode nada!

domingo, 27 de setembro de 2009

26 de Setembro - OS 2 ANOS DO ANDRÉ

Hoje é domingo, dia 27 de Setembro e igualmente dia de eleições legislativas. Encontro-me em casa, pois a minha mulher, Elsa, está a trabalhar na Junta de Freguesia, onde é funcionária e como habitualmente nestes dias tem de trabalhar.
Por isso ocupo o meu tempo escrevendo o que me vem à ideia. A televisão transmite uma reportagem sobre a produção de arroz em Portugal. É mais um rol de queixas, dos responsáveis pela produção daquele cereal, pela forma e pela falta de vontade politica, de quem nos governa em resolver os problemas dos nossos agricultores. Aliás, neste País não são apenas os agricultores a queixarem-se, são todos os sectores, a saúde, a educação,os transportes, o imobiliário, os desempregados etc etc. Hoje muita coisa poderia ser alterada, mas tudo indica que apenas a maioria absoluta vai ser transformada em maioria relativa. A ver vamos.
Ontem, 26 de Setembro o meu netinho André completou o 2º aniversário. O meu netinho é para mim e para a avó Elsa a melhor coisa que nos aconteceu. A nossa vida é em função daquela vida recente que é a do André. A ansiedade do fim de semana e do reencontro com aquele pequenino ser e naturalmente com seus pais é enorme. Há quem diga que os avós têm um comportamento afectuoso, diferente para com os netos, daquele que tiveram em relação aos filhos. Pela minha parte afirmo que isso é verdade e que mais uma vez o filho me perdoe.
Pois, foi a festa do 2º aniversário do André. Quando chegámos a sua casa em Santiago do Cacém, já o nosso neto andava numa roda viva, com os seus amiguinhos e amiguinhas, remexemdo nos muitos brinquedos que possui e noutros que lhe tinham sido oferecidos. A azáfama era tanta, que olhou para nós, com carinho é certo, mas a dizer ao mesmo tempo. "Hoje para além de vós, tenho que ser um bom anfitrião dos meus amigos e amigas" E nós compreendemos perfeitamente a tarefa que o Andre tinha naquele momento.
O telefone entretanto não parava, pessoas felicitando os pais pela data que se festejava. Alguns ausentes noutras paragens nem por isso esqueceram a data. O meu sobrinho Luis Carlos de França foi um deles. Já antes a minha irmã, igualmente em França, o havia feito, pesarosa por não poder estar presente. Mas, , a saúde está primeiro e tu agora precisas muito de encarar a vida como um dom muito precioso e teres contigo uma força do tamanho do mundo para continuares a lutar com a doença. E isso vai acontecer.
O tio Zé Francisco, a prima Marta tambem ligaram bem como a Joana que se encontra a completar o doutoramento na Escócia ( jinhos joana!). Outros familiares que possam ter ligado me perdoem se não os menciono.
Presentes igualmente outros familiares especialmente os avós maternos Gertrudes e Carlos Alberto. A festinha foi abençoada com a presença do nosso priminho e padre Hugo, que, diga-se está um pouco gordinho e a necessitar de exercício fisico.
O André esse, estava feliz e maior foi a felicidade, quando ao colo dos pais(babadinhos) apagou as velinhas do bolo de aniversário.
Enfim, uma linda festa, a do aniversário do nosso André. Que muitos, muitos, muitos mais aniversários sejam festejados para alegria do André e de seus pais Joana e Luis Miguel.
(e dos avós maternos e patermos, também, claro!)

BISPO DE NAMPULA - D. MANUEL VIEIRA PINTO - continuação

Chegados a Santarém eu e meu amigo José R. percorremos alguns locais da cidade, fazendo tempo até à hora do autocarro que nos levaria ao Cartaxo.
Já no Cartaxo, tratámos de perguntar onde se situava a quinta da famila X, que nos tinha sido indicada a partir de Moçambique.
Aí nos dirigimos e encontrámos um local circundado por um muro , cuja entrada era feita por um portão senhorial que se encontrava encerrado. Batemos e pouco depois um empregado da casa abria-nos a porta. Dissémos que desejávamos falar com o dono ou dona da casa. Dissémos igualmente que trazíamos uma mensagem de Nampula para entregar. O empregado retitou-se e algum tempo depois, veio uma senhora que nos cumprimentou amávelmente e nos convidou a entrar. Uma vez lá dentro, o meu amigo informou dos fins que ali nos levavam, ao que a senhora respondeu:
- O senhor Bispo está neste momento a descansar, mas podem entregar-me a carta que lha entregarei. e adiantou:
- os senhores veram meter-se numa grande embrulhada - a minha casa está constantemente a ser vigiada pela policia politica, e neste momento vocês já estarão fotografados, pois eles encontram-se instalados na casa em frente.
E, foi aí, nesse preciso momento que tanto eu, como o meu amigo José R. caímos na realidade que nos rodeava. Chegámos por experiência própria à conclusão de que algo de errado havia neste País que tanto amávamos. Algo que nos impedia de fazer coisas tão simples, como entregar uma carta. Algo que iria ser mudado daí a dias, graças ao glorioso movimento dos capitães.
Conseguimos iludir os PIDES, que pelos vistos ocupavam a vila do Cartaxo. Sem sabermos como, entrámos num autocarro que estava parado e seguimos viagem dali para fora. Só que o autocarro não ia para Lisboa mas sim para as Caldas da Rainha. O condutor aconselhou-nos a sair numa próxima paragem e ali aguardarmos o autocarro para a capital. Era já noite, nada se enxergava à nossa volta. Aguardámos cerca de uma hora e eis que vem um autocarro, esse sim para Lisboa.
Chegados a Lisboa, o meu amigo dirigiu-se para sua casa na zona oriental, e eu tomei o barco no Cais do Sodré, para Cacilhas e daí para Almada onde residia.
No dia seguinte o meu amigo José R., comunicava-me que tinha a porta da sua casa vigiada por um individuo, que segundo ele, deveria ser da policia poltica. Eu, no Arsenal do Alfeite, decerto estaria também a ser vigiado.
Ate que, daí a dois dias, de manhã cedo como habitualmente, saí da minha residência em Almada, na zona do Cristo Rei, e percorri a grande distância que me separava do Arsenal do Alfeite onde trabalhava. Digo grande porque o era, tinha que descer até à Cova da Piedade, e daí continuar até ao Portão da Base Naval de Lisboa, onde se situava e situa o Arsenal. Mas, para surpresa minha, nesse dia a entrada estava impedida por muitos guardas. Ninguém podia entrar e falava-se de que o motivo seria algo que se estava a passar em Lisboa. Algo de muito importante, uma revolução, que iria mudar completamente a maneira de ser e viver dos portugueses e de Portugal. O 25 de Abril estava na rua.
BISPO DE NAMPULA – D. MANUEL VIEIRA PINTO
Factos que ficaram na memória.

Estávamos no ano de 1974. Dias antes da data histórica e libertadora do 25 de Abril, mais propriamente no domingo anterior. Eu era um simples operário metalúrgico do Arsenal do Alfeite. Residia em Almada, num quarto alugado. Era jovem, tinha 26 anos de idade e havia regressado quatro anos antes da guerra colonial na Guiné.
Nunca me havia confrontado com problemas políticos e posso até mesmo dizer que, apesar de alguma revolta interior por terem sido desperdiçados os anos da juventude, numa guerra que nada me dizia e da qual não se vislumbrava o final, o certo é que não desenvolvia qualquer actividade, contra ou a favor do regime existente. Limitava-me a trabalhar, na categoria de serralheiro mecânico, ganhando pouco mais de mil escudos, que mal davam para pagar o quarto, pagar as refeições e comprar alguma roupa a prestações. Tinha consciência de que minha mãe não me poderia valer pois também ela, garantia o seu sustento como trabalhadora rural.
As minhas distracções resumiam-se a um ou outro filme na Incrível almadense, numa ou outra ida a praia, na Caparica e a um passeio ou outro por Lisboa.
Era em Lisboa que tinha um amigo, que ainda o é hoje, e que periodicamente visita a minha casa em Alvalade. Esse meu amigo o José R. trabalhava num escritório de advogados enquanto estudava para ser solicitador, profissão que conseguiu e exerceu. Esteve também na guerra colonial, mas em Moçambique, mais propriamente em Nampula.
O José R. era católico praticante e frequentava a Missão Católica em Nampula, tendo-se tornado grande amigo dos padres e religiosas que ali desenvolviam a sua missão junto da população pobre e explorada de Moçambique. Igualmente aí conheceu o bispo de Nampula, D. Manuel Vieira Pinto, também ele um revoltado contra o sistema que escravizava o povo moçambicano.
Não sei se D. Manuel ainda é vivo, mas se o for, muito gostaria de lhe dar a saber este relato.
Pois, em determinada altura e pouco antes do 25 de Abril de 1974, D. Manuel Vieira Pinto foi expulso de Moçambique, veio para o continente onde ficou abrigado na residência de uma família abastada do Cartaxo.
Depois disso, uma das religiosas da Missão de Nampula, entendeu enviar ao meu amigo José R. uma carta, para o mesmo entregar directamente ao bispo de Nampula, pois se viesse pelo correio a PIDE, se encarregaria dela como seria óbvio.
O José R. telefonou-me e convidou-me a ir com ele ao Cartaxo, num domingo, precisamente aquele que antecedeu o 25 de Abril, para entregarmos a carta. Com as características próprias das nossas idades, não olhámos ao perigos e consequências e lá seguimos nesse domingo, manhã cedo, de comboio a partir de Santa Apolónia e até Santarém.
(continua)

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

AINDA AS FEIRAS EM ALVALADE - Minhas memórias

Mas voltemos aos dias de feira. Logo que chegávamos à estação da CP, se notava que os dias eram diferentes. As linhas-férreas estavam completamente cheias de vagões, que serviriam para o transporte do gado comercializado na “ corredoura”.
A corredoura, como se chamava ao local onde se concentravam os rebanhos de ovelhas e cabras, as manadas de vacas e bois, as varas de porcos, situava-se à entrada da Vila, antecedida pelo acampamento da “ciganada”. Alvalade era na altura rodeada de extenso olival e era aí, no olival que se faziam os negócios de transacção do gado. Na estrada da estação, os ciganos tentavam vender as suas mulas e burros, correndo com os mesmos para mostrarem que não coxeavam.
Depois, frente à Escola Primária, aí sim – começava a feira. Logo aí ficava o carrossel ou carrosséis, porque por vezes era mais que um, mas geralmente o “Alegria” e o “Vieira”. Depois ao lado destes, o circo, geralmente o Cardinal, Na mesma zona as barracas do tiro ao alvo, ou as barracas das “meninas” como eram chamadas as prostitutas, onde depois do negócio de gados os comerciantes e lavradores se divertiam, entregavam ao prazer carnal e deixavam muitas vezes o resultado do negócio.

Também aí ficava instalado o Poço da Morte, ou o baloiço de roda.
A seguir as barracas de roupas, o pronto a vestir e depois as barracas de brinquedos e quinquilharias, seguidas das louças de barro, cadeiras de buinho, latoaria etc. Mesmo à entrada da feira, ficava sempre instalada a barraca das fotografias à lá minuta. Aí se juntavam as famílias, que só se encontravam nos dias da feira, para tirarem os retratos e ficarem com uma recordação. Deixando o olival e entrando na Vila, situavam-se as barracas dos frutos secos, geralmente na posse de algarvios que aqui se deslocavam, para venderem os figos secos, as amêndoas, as nozes, as alfarrobas e miniaturas de animais feitas de figo. Os pais e mães para não cederem aos pedidos dos filhos, diziam: aquilo não presta, filho! Aquilo é amassado com o cu das algarvias!
Mais acima, já quase na entrada do Largo da República, eram as frutas. As mais procuradas sem dúvida, eram as nêsperas. E recordo aqui o pregão das vendedeiras “ levem-na boa nêspera , meninas”, o que, naturalmente fazia corar as donzelas que passavam.
Entretanto e dado que nessa altura não havia abastecimento de agua, a mesma era vendida na feira pelos “aguadeiros”. Estes eram moradores da terra, que aproveitavam a ocasião para amealharem alguns patacos. O pregão também me ficou nos ouvidos: “agua fresca regalada, dois tostões é uma barrigada”. As crianças percorriam a feira procurando pessoas conhecidas, familiares ou não, pedindo “as feiras”. E logo após os tostões na mão, iam gastá-los nos pirolitos ou no torrão de Alicante.
A feira mudava Alvalade como da noite para o dia. Dezenas de comerciantes visitavam a localidade e o desenvolvimento notava-se nesses dias. As transacções efectuadas durante a feira, eram festejadas à noite, nas tabernas, uma delas a do Vitorino.
Café ? apenas o do Vasco, onde se serviam galões e garotos de boa qualidade. Igualmente nas tabernas se faziam ouvir os melodiosos cantes alentejanos, porem, só até determinada hora, pois a GNR da altura, a mando do regime politico que vigorava, não o permitia.

(continua)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

AS FEIRAS DE ALVALADE

Eram assim passados os dias que antecediam as duas feiras anuais da vila – a de Abril, a mais antiga e a Feira Nova de Julho. Nas vésperas destas feiras era espantoso ver passar pela herdade rebanhos e rebanhos de ovelhas e cabras, manadas de vacas, que eram levados à feira para serem negociados. Logo bem cedo o badalar dos chocalhos, os maiorais assobiando, os cães a ladrarem faziam-nos sentir num ambiente que só o Alentejo desses tempos o permitia. O progresso, com tudo acabou!
Os dias que antecediam as feiras eram dias de grande azáfama. Não se falava noutra coisa senão nos grandes dias da feira. Pensavam-se e compunham-se os trajes que cada qual, segundo as suas posses deveria “estrear” nos dias de feira. Eu no meio daquele entusiasmo todo, diariamente perguntava aos trabalhadores da herdade, que moravam na Vila:
- Já lá está o carrossel?
- E o circo?
E eles, lá me iam informando:
Sim já chegou o carrossel Vieira que tem curvas valentes – e o circo Cardinal entrou ontem pela rua do Posto e foi uma carga de trabalhos! (dada a inexistência da ponte dos arcos, a entrada da Vila era feita pela Rua do Posto)
E, no dia da feira, no 1º dia, porque ambas duravam 2 dias, era ver passar grupos e grupos de gente, vindos dos Foros de Vale Lobo, uns a pé outros em carroças. Poder-se-ia dizer que a feira se estendia pelos campos, pelas herdades, tal o entusiasmo que se verificava.
Logo de manhã, minha mãe, dava-me o banho, no alguidar grande de zinco e vestia-me a rigor. E depois de tomado o cavalo, o Morgado – um animal cinzento, lindo, que se havia comprado por intermédio do Zé Rato – lá seguíamos na carrinha, a caminho da Vila, para a feira

(continua)