domingo, 11 de abril de 2010

AS MINHAS MEMÓRIAS - Os banhos de 29 em Sines

OS BANHOS DE 29 EM SINES


Ainda hoje, ao verificar as iniciativas que muitas autarquias levam a efeito, para relembrar datas festivas já em desuso e até no esquecimento, recordo os Banhos de 29. Que data, sempre aguardada com muito entusiasmo, por todos , tanto aqueles com algumas condições económicas favoráveis, como aqueles que mal ganhavam para o seu sustento, e estes, a maioria.
Os banhos de 29, eram a 29 de Agosto. Nesse dia , muitas pessoas se dirigiam, bem cedo, das herdades, pelos caminhos empoeirados, para a estação dos caminhos de ferro. Alguns percorriam 10 e mais quilómetros, carregando cestos, com a galinha “acerejada”, o garrafão vinho e tudo mais que confortasse o estômago, naquele dia de festa.
O comboio que nos transportava a Sines, era o comboio das 8. Partia da Funcheira e chegava à estação de Alvalade às 8 horas da manhã. Dai o ser conhecido por “comboio das 8”. Nesse dia, fosse domingo ou dia de semana, grande parte das pessoas da zona fazia a viagem, de Alvalade a Sines, para o “banho de 29” É que, nesse dia o banho era considerado “banho santo” Aliás em muitas localidades do litoral se festeja esta data da mesma forma, embora com nomes diferentes. Por exemplo, no Algarve, em Mantarrota, neste dia faz-se grande festa , que é chamada o “S. João da Degola”.
Pois no dia 29 de Agosto de cada ano, a composição ferroviária que nos dias normais era constituída por três carruagens, a de 1ª (pouco ou nada utilizada) a de 2ª e a de 3ª classe, era aumentada para mais 8 ou dez carruagens, originando uma sobrecarga para a ronceira locomotiva a carvão, que se via e desejava para efectuar a subida do “ monte” da Mal Assentada, situado entre Alvalade e Ermidas. Mas enfim, lá chegava à estação de Ermidas, onde a locomotiva teria de ser abastecida de agua, de efectuar varias manobras, para poder seguir na direcção de Sines, continuando a recolher passageiros e banhistas oriundos de Abela, de S. Bartolomeu da Serra, de Santiago do Cacém. Chegada a composição a Sines era digno de se ver, a quantidade de pessoas, homens, mulheres, crianças, que carregando os farnéis, se dirigiam à praia.
Ali chegados, estendiam-se cobertores na areia, e logo de seguida, os homens com as calças arregaçadas, vendo-se os atilhos das ceroulas, as mulheres segurando as saias (fatos de banho eram luxo), embora na praia se pudessem alugar, mas só alguns o podia fazer.
Minha mãe pagava a um “banhista” – homens que a troco de umas moedas, levavam as crianças a mergulhar. E então havia choro, gritaria, enquanto nós crianças éramos mergulhados nas aguas. Mas ai de quem viesse a Sines e não molhasse o corpo no dia 29 de Agosto.
Depois o almoço e cada um apresentava os géneros alimentícios que as suas posses lhe permitiam, chouriço, linguiça, toicinho, uma ou outra galinha “acerejada” ( assada), o bom pão caseiro, e naturalmente o vinho.
Passava-se a tarde. Estendidos na areia, a dormir, enquanto nos altifalantes espalhados pela praia, se transmitiam discos pedidos. E ouvia-se então : “ vamos transmitir o fado barco negro, interpretado por Amália Rodrigues, a pedido duma menina de Alvalade que dedica a um certo rapaz das Ermidas” Claro, que nestes tempos nada mais se poderia dizer, pois o segredo era alma do negócio.
Findo dia e depois de se terem comido as “línguas de sogra” que se vendiam pela praia, tudo se dirigia novamente para o comboio. Era o regresso a casa, levando consigo as mais gratas recordações de um dia excepcional, que logo ali, nesse momento, se desejava ser repetido no ano seguinte.