quinta-feira, 1 de julho de 2010

AS MINHAS MEMÓRIAS - Cronicas da Vida Militar - 2

CRÓNICAS DA VIDA MILITAR (2)


Ingressei no exército, em Junho de 1969, tendo sido incorporado, no então CISMI (Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria), em Tavira. Curiosamente, na gíria militar, aquela unidade era apelidada por – CISMI – Centenas de Indivíduos Sacrificados Martirizados inocentemente.

Embarquei em Alvalade, no comboio “foguete” que por aqui passava pela madrugada, com destino ao Algarve. Cheguei como muitos outros, às portas de quartel, antes do nascer do sol e aí nos juntámos aguardando que os portões se abrissem.

Lembro-me, que entre nós, estava um jovem, igualmente à civil, com o cabelo um tanto crescido, ao contrário dos restantes, com o mesmo cortado a pente zero. E, então, um de nós acercou-se dele e disse-lhe” Oh militar, esse cabelinho não está grande demais?” O outro não lhe respondeu. Por fim lá se abriram os portões e de imediato fomos convidados a formar na parada. Quando tal aconteceu e chegados os oficiais, para nosso espanto, e terror daquele que havia chamado a atenção do que tinha o cabelo crescido, deparámos com um tenente, de varinha na mão, que berrava com todos, ordenava castigos corporais. Foi o primeiro contacto com a acção psicológica que havia fazer parte dos dias seguintes. O tal tenente, tinha fama nas guerras de África, pelas torturas que aplicava nos indígenas. Curiosamente não me lembro o seu nome. mas tudo me parece que era o famigerado tenente Robles, conhecido também pelo Trotil. Quando se acercou de mim, apontando-me a varinha ao peito disse-me: donde é que você é? E eu respondi, eu sou de Alvalade-Sado. Prontamente, aquela besta fascista gritou: onde é que fica essa merda?

Esta foi a recepção. Não só a mim, como aos restantes, que constituíam mais uma remessa de “carne para canhão”.

A recruta em Tavira foi o pior que nos poderia acontecer. A alvorada às seis da manhã. A formatura logo de seguida e depois do pequeno almoço ( agua com café) a ordem unida do costume, no campo da Atalaia. Exercícios físicos duros, preparavam-nos para África. O “galho”, “pórtico”, o rastejar pelo pó e pela lama das salinas, faziam de nós, não pessoas humanas mas sim autênticos animais .

Os dois meses e tal da recruta depressa se passaram. Após esta fase, deram-me a profissão de “mecânico auto”, eu que nem sabia o que era a vela de um motor. Mas a atribuição de especialidades não deixava de ter a sua graça. Por exemplo a um aspirante das finanças deram-lhe a especialidade de enfermeiro ( o meu querido amigo furriel Pais).

Investido naquelas funções – mecânico auto – guia de marcha para Sacavém, afim de aprender a lidar com os motores das viaturas. Nada se aprendia claro! Passávamos os dias entretidos à volta de um motor de viatura e no fim do curso eis que somos promovidos a cabos-milicianos do serviço de material e enviados para os CICA’s – Centros de Instrução Auto, a fim de tirarmos a carta de condução. Outra anedota: - em quinze dias estávamos aptos a conduzir viaturas ligeiras e pesadas. A mim calhou-me o CICA de Elvas, instalado no aquartelamento ali existente. Lembro-me que à chegada ao quartel, ficámos horrorizados pois as camas que nos foram atribuídas estavam pejadas de percevejos. Claro que, com muito sacrifício conseguimos juntar-nos e alugamos quartos na cidade. A instrução era-nos dada por um antigo colega meu, da Escola Industrial de Beja, com o posto de furriel miliciano. Como disse bastaram 15 dias para nos porem na mão a “carta verde”.

Lembro-me do exame de condução. Asneiras sobre asneiras. A mim calhou-me não acertar com a saída do aquartelamento. Após várias “marchas atráz” lá consegui enfiar o camião no portão da muralha.

Depois, novamente para Sacavém, onde nos foram atribuídas as unidades militaresnde iríamos prestar serviço da nossa especialidade – “mecânicos auto”

A mim saiu-me na sorte a Escola Prática de Artilharia em Vendas Novas. E digo sorte porque foi aí que tive os meus melhores tempos de serviço militar.

(continua)