domingo, 15 de maio de 2011

PASSADO RECENTE- A Minha Pergrinação a pé a Fatima-2003--2

A MINHA PEREGRINAÇÃO A FÁTIMA, A PÉ (2)

DE S.MARTINHO DE CASEBRES ATÉ CANHA


Seguiu então o grupo de peregrinos, de S. Martinho de Casebres, até Canha, passando por Vendas Novas. Cabe aqui referir que a peregrinação estava bem organizada. Carros de apoio, entre os quais uma carrinha da Casa do Povo de Alvalade, conduzida pelo dirigente Arnaldo Borges. De tantos em tantos quilómetros, pessoal da equipa de apoio, aguardava-nos com agua e distribuição de rebuçados.

Alguns quilómetros percorridos, a nossa companheira Regina Borges, foi acometida de um problema que também a mim, dias mais tarde me havia de acontecer. Estava previsto, a organização havia-nos dito, que durante a caminhada poderíamos ser afectados psicologicamente. E foi o que se passou com a Gina, que não parava de chorar, sem que alguém soubesse a razão de tal facto. Parámos, em determinada altura, para descanso e comermos algumas peças de fruta. Aí, todos nós, demos uma ajuda à Gina, a ponto de, começar a animar-se e no arranque, de novo na estrada, a nossa companheira lá seguiu ainda com maior ânimo, levando consigo o estandarte da peregrinação.

De acrescentar, que durante a caminhada, havia tempo para tudo. Tempo para rezar, tempo para reflectir, no mais completo silêncio, quando se ouviam apenas o bater dos bordões no alcatrão da estrada, tempo para cantar e até para contar anedotas. Em cada paragem, os peregrinos massajavam as pernas com cremes apropriados, descansavam um pouco e depois um tanto ultrapassado o cansaço, lá seguiam para nova jornada.

Atravessámos Vendas Novas e aí, veio-me à memória os tempos que ali passei, no serviço militar. Ali ingressei em 1970, antes de ser mobilizado para a Guiné. A seu tempo relatarei também esses tempos que fazem parte das minhas memórias.



Vista da cidade de Vendas Novas

Depois de Vendas Novas, já ao fim do dia aproximava-nos completamente estafados e com os pés já enfeitados de algumas bolhas, do nosso destino – a Vila de Canha.


Quartel dos Bombeiros V. de Canha

Aí chegados dirigimo-nos ao quartel dos Bombeiros Voluntários, que nos apoiaram, no alojamento. Após o tão desejado banho, dirigimo-nos às instalações da santa Casa da Misericórdia que nos forneceu um reconfortante jantar. Regressados ao quartel , fomos surpreendidos pela presença de um grupo de bombeiros que voluntariamente se dispôs a dar-nos massagens que em muito ajudaram o grupo a prosseguir no dia seguinte.

DE CANHA ATÉ CORUCHE

E, o dia seguinte, igualmente pelas seis horas da manhã, tudo a postos para mais uma etapa e esta bastante longa. Iríamos continuar pelo Ribatejo, de Canha até Coruche, aonde iríamos pernoitar, na Santa Casa da Misericórdia.

E a melhor forma de iniciarmos esta caminhada, foi com muita devoção, enquanto andávamos rezámos o terço. Cada qual pensou nesse momento nos seus problemas, sendo que uma das formas de os ultrapassar residia precisamente nesta devoção, nesta oração, nos cânticos que se faziam ouvir no silêncio dos campos, interrompido apenas com a passagem de viaturas, que nos saudavam com o som estridente dos veículos,

Durante o percurso, fizemos uma paragem debaixo das arvores e foi celebrada a Eucaristia, pelo padre Silveira. Depois, mais animados e confortados, o grupo seguiu a caminho de Coruche. E foi a alguns quilómetros, que também eu, fui acometido de uma crise psicológica, relacionada talvez com a saudade dos familiares, que felizmente ultrapassei e me deu forças para continuar.

E eis-nos chegados a Coruche mais propriamente às instalações da Santa Casa da Misericórdia, situadas numa antiga quinta na várzea fronteira a Coruche.

A Mesa da Misericórdia, havia-nos proporcionado alojamento, num sótão, onde tinham sido espalhados colchões. Um verdadeiro hotel para os caminhantes que nessa altura acusavam já algum cansaço. Após a chegada, realizou-se uma Missa na capela, celebrada por um cónego cujo nome já não recordo. Seguiu-se um jantar servido no refeitório da instituição, após o que recolhemos aos “aposentos” que nos tinham sido reservados.

DE CORUCHE A ALMEIRIM

No dia seguinte, o 9º da caminhada, teríamos de percorrer o caminho de Coruche até Almeirim. Ao nascer do sol o grupo de peregrinos , saiu das instalações da Misericórdia, depois de uma oração conjunta onde agradecemos e desejámos as bênçãos de Deus e de N. S. de Fátima para quem tão bem nos havia recebido – a Santa Casa da Misericórdia de Coruche. Atravessámos a linda Coruche, subindo a encosta até Santo Antonino e daí em direcção a Almeirim, passando por diversas localidades cujos habitantes nos recebiam com muito carinho. De realçar que foi durante este percurso, que avistámos um simbolo, que nos transmitiu uma força interior extraordinária e que nos deu ânimo redobrado - num cruzamento de estradas, uma placa indicava FATIMA. Verdadeira alegria.

À chegada a Almeirim, um incidente marcou a nossa viagem. Um dos nossos companheiros, sentiu-se mal e tivemos de chamar uma ambulância que o transportou ao hospital. Regressou mais tarde restabelecido, mas, creio que não teve condições de saúde para caminhar, tendo feito o percurso num dos carros de apoio. Aqui, ficámos hospedados na Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Almeirim, que igualmente se esmerou na recepção aos peregrinos de Fátima.

DE ALMEIRIM À GOLEGÃ

Dia seguinte, percurso de Almeirim à Golegã, novamente os momentos de oração, de recolhimento, mas também os habituais momentos de alegria partilhada das mais diversas formas. A passagem pelo dique dos vinte foi inesquecível, embora um tanto perigosa, pois a estrada era estreita e as bermas por onde caminhávamos exigia redobrados cuidados. Também na Golegã foi a Santa Casa da Misericórdia quem nos acolheu. Aqui tivemos o grato prazer de ter à nossa espera, o alvaladense José dos Reis com sua família, que de uma certa forma ajudaram a mitigar as já intensas saudades dos familiares. No dia seguinte esperava-nos a etapa até Torres Novas, penúltima até atingirmos o nosso objectivo – o Santuário de Fátima.

(continua)

sábado, 14 de maio de 2011

PASSADO RECENTE-A mimnha Peregrinação a Pé a Fatima-2003 --1

 
















A MINHA PEREGRINAÇÃO A FÁTIMA, A PÉ (1)


Hoje, noite de 12 para 13 de Maio de 2011, resolvi transmitir aqui, algo de que nunca falei e que se prende com a peregrinação a pé, que fiz em 2003, desde a minha Vila – Alvalade, até Fátima.

Em 2002, enquanto decorriam as obras, muito atribuladas, da construção do novo Centro de Dia de Alvalade, em determinado momento e face aos inúmeros problemas que diariamente se deparavam aos dirigentes da Casa do Povo de Alvalade, relacionados com a construção, em plena obra, encontrando-me acompanhado da senhora presidente do Conselho Fiscal, Dª Maria Regina Ferreira Borges, momentaneamente exaltei-me e gritei : “se me vejo livre disto, eu vou a pé a Fátima”, ao que a referida senhora, batendo-me no ombro disse “ e eu vou consigo”! Claro que foi um desabafo, pois sabendo as dificuldades que tal acto acarretava, talvez tivesse pensado mais um pouco.

Passou-se o ano de 2002 e em 2003, aproximava-se o momento da conclusão desta obra que veio engrandecer Alvalade e os alvaladenses. Por intermédio de alguém, tive conhecimento de que a partir de Alcácer do Sal, se estava a planear uma ida a Fátima a pé. Assim que me foi possível, desloquei-me àquela localidade e falei com o Pároco, (creio padre Silveira) senhor já muito idoso , e que ao tempo em que escrevo esta crónica já partiu de entre nós. A partir dele fui colocado em contacto com duas senhoras, uma a gerente do restaurante Boa Viagem (Dª Isabel)e na Câmara de Grândola(Arq. Maria João), principais organizadoras da caminhada. Imensamente simpáticas logo me inscreveram e deram pormenores sobre a “aventura”.

Regressado a Alvalade, contactei o pároco, padre Paulo do Carmo, a quem coloquei ao corrente das minhas intenções, tendo o cuidado de referir que não o faria para pagamento de qualquer promessa, dado que para mim, esse tipo de promessas constituíam chantagem.
O pároco na primeira oportunidade deve ter referido o facto e logo de imediato, se me juntaram, mais cinco senhoras, entre as quais a já citada presidente do Conselho Fiscal da Casa do Povo, Regina Borges. As restantes foram – Graça Mateus, Mariana Loução, Maria José Aires, Mariana Lima, Eugénia Godinho e naturalmente eu Luís Silva. No carro de apoio, acompanhou-nos o marido de Dª Regina, Arnaldo Borges, igualmente dirigente da instituição. Foi este o primeiro grupo de peregrinos a pé a Fátima, a partir da freguesia de Alvalade-Alentejo.

Como tínhamos de nos juntar aos peregrinos de Alcácer do Sal, daí a dias, e já quase em Fátima a um grupo de mais de 800 peregrinos da Arquidiocese de Évora, tivemos que partir de Alvalade alguns dias antes. A partida, foi feita da Praça D. Manuel I, depois de, em cerimónia religiosa, na Matriz, os bordões de peregrinos que nos iriam acompanhar, terem sido benzidos pelo pároco, o qual nos ofereceu a todos um rosário que nos acompanhou.
A partida, na Praça, foi pelas 2 horas da tarde, debaixo de uma temperatura nada animadora e acompanhada de muitas pessoas que solidárias quiseram dizer adeus e desejar-nos felicidades, acompanhando-nos muitas até à Mimosa.

Esta primeira etapa seria de poucos quilómetros, até à aldeia de Azinheira de Barros, onde ficaríamos sob a guarida do Centro de Dia, sendo um dos dirigentes o senhor António Ruas, hoje presidente da Junta de Freguesia daquela localidade. Apesar de ser pequena a distância, quando o grupo chegou à fonte de Ermidas , já era visível o cansaço. Após breve descanso rumámos a Azinheira de Barros, onde após a chegada fomos confortados com um banho refrescante e um jantar maravilhoso. Após a dormida, nos sacos cama, no salão de convívio, no dia seguinte, pelas seis horas da manhã, após o pequeno almoço, rumámos a Grândola, cerca de 15 quilómetros. Aí chegados fomos alojados nas instalações da Santa Casa da Misericórdia, colocadas a disposição do grupo pelo senhor Provedor Horácio Carvalho, que depois do jantar, nos acompanhou na recitação do terço.

Igreja de N. S. dos Mártires - Alcácer do Sal
Terceiro dia , percurso entre Grândola e Alcácer do Sal. Durante o caminho a chuva, em pequena quantidade veio fazer-nos companhia. Também aqui valeu-nos a Santa Casa da Misericórdia que nos alimentou e deu alojamento. No quarto dia foi de descanso e preparação para as diversas etapas, até Fátima. No quinto dia, foi a partida de Alcácer do Sal, na companhia de mais cerca de 50 peregrinos de todas as idades. Foi emotiva esta partida. Feita a partir da Igreja da Senhora dos Milagres, (local por onde segundo se diz, passavam os peregrinos que do sul, se deslocavam a Santiago de Compostela), após cerimónia religiosa, na qual para alem dos párocos de Alcácer, se encontrava igualmente o pároco de Alvalade.

Seguimos então pela estrada que conduz a Lisboa e mais adiante, seguimos em direcção da localidade de Casebres ou mais propriamente de S. Martinho de Casebres, onde ficámos alojados no edifício do Centro de Saúde local. Numa dependência os homens, em sacos cama, noutra as mulheres. Instalações sanitárias eram escassas, pelo que muitos optavam por se servirem do ambiente da natureza, para as necessidades. Além disso, era noite e o escuro ajudava. Foi então que aconteceu o primeiro episódio que contribuiu para a boa disposição do grupo e que merece ser relatado.

Em Casebres, como na maioria das localidades do interior, a falta de assistência médica, era (e é infelizmente, cada vez mais) notória. Pelo que para terem consulta, os habitantes tinham de ir para a porta do Posto Médico, a fim de conseguirem atendimento, bastante cedo, neste caso, pelas 5 horas da manhã. Uma senhora já idosa, assim fez e aí vai ela a caminho da porta do Posto Médico, a fim de conseguir a consulta. Só que nessa altura, uma das peregrinas resolveu sair do edifício a fim de fazer uma “visita” à natureza e assim satisfazer as suas necessidades fisiológicas.

Quando abriu a porta do exterior, em camisa de dormir, a anciã que esperava cá fora, desconhecendo que o edifício estava ocupado pelo peregrinos, desatou a correr e a gritar, que estavam a assaltar o Posto Médico. Com o alvoroço, outros peregrinos acordaram e juntamente com alguns vizinhos, conseguiram acalmar a senhora, contando-lhe a situação. Naturalmente que nesse dia, a alvorada foi mais cedo.

E, após o pequeno almoço, o grupo retomou o caminho, até Canha, passando por Vendas Novas.

(Continua) --

segunda-feira, 25 de abril de 2011

MINHAS MEMÓRIAS- 25 de Abril Sempre!

25 de ABRIL – SEMPRE!


Há 37 anos – Almada – manhã do dia 25 de Abril. O serralheiro mecânico do Arsenal do Alfeite, Luís Martins Silva, preparava-se para iniciar mais um dia de trabalho. Desceu de Almada – avenida do Cristo Rei, onde morava num quarto alugado, para a Cova da Piedade e daí até ao portão do Arsenal do Alfeite. Lá chegado, estranhou estar vedada a entrada aos operários e a outros funcionários do estaleiro naval. Nos seus 24 anos, encarou o sucedido como algo de aventureiro que se estaria a passar. Entretanto já se murmurava sobre o que se desenrolaria em Lisboa desde as primeiras horas da madrugada. Pelos vistos havia uma revolução. Sem entender bem o que se passava, mas já com algumas luzes no espírito, sobre questões politicas, adquiridas ao longo da guerra colonial na Guiné, donde havia regressado dois anos antes, algo me dizia que se estariam a viver momentos históricos. Três dias antes tinha tido o primeiro contacto com a policia politica - PIDE, no episódio já aqui relatado noutra crónica e relacionado com o Bispo de Nampula D. Manuel Vieira Pinto.

Depois de várias horas sem que os portões do estaleiros navais da Marinha de Guerra Portuguesa, se abrissem, foram transmitidas por um oficial da Marinha, indicações de que até novas ordens, o trabalho estaria suspenso. Regressei pois a casa e daí, dirigi-me a Cacilhas, com o fim de tentar saber mais daquilo que se estaria a passar em Lisboa, ou até mesmo embarcar para a outra margem, para acompanhar ao vivo o desenrolar da revolução. Mas, estavam cortadas as carreiras de barcos cacilheiros para e de Lisboa. No cais aglomerava-se uma pequena multidão ansiosa por saber concretamente o ponto da situação. Até que, passadas horas, o primeiro comunicado na rádio anunciava: “Aqui Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas….”

Era a libertação do País, era a entrega da dignidade roubada pelo fascismo, aos portugueses, iniciativa de um grupo de capitães milicianos, do M.F.A. a que se estaria a juntar o povo português, que, segundo as noticias e comunicados enchia as ruas de Lisboa. Momento alto e que jamais seria esquecido.

Momento que hoje, passados 37 anos, voltamos a festejar, embora o povo português esteja a passar por graves dificuldades. Graves dificuldades resultantes dos erros de tantos que se apoderaram do 25 de Abril, como se fossem os únicos mentores desta data gloriosa: Os políticos carreiristas dos sucessivos governos, mas não só. Outros mais, parece entenderem serem eles os únicos neste processo. E sejam de direita, sejam de esquerda. Parece terem esquecido aqueles que em África numa guerra injusta tomaram a consciência libertadora, aliada aos que na clandestinidade lutaram por uma mudança.

Continuamos a festejar Abril, como sempre o fizemos, se bem que, já de uma forma menos intensa do que aquelas comemorações de anos idos. Ouviram-se na passagem da meia noite, meia dúzia de foguetes tímidos, a anunciarem um grande dia. Diferente este raiar do 25 de Abril, daquele que em anos anteriores faziam de Alvalade, a freguesia do concelho, onde com mais intensidade popular esta data era festejada. Hoje? Bem hoje, nada era como dantes. Meia dúzia de foguetes, nada de fogo de artificio, um baile no largo, onde faltam as habituais tasquinhas das instituições locais que foram ignoradas e amanhã 25 de Abril, apenas uma arruada com banda de música. Nada como era dantes! Será que o 25 de Abril, perdeu o seu valor? Como resposta apetece gritar 25 de ABRIL – SEMPRE!

Hoje dia 25 de Abril, pela primeira vez, irei rumar à capital. E à tarde, irei descer a Avenida da Liberdade, como muitos milhares para quem a chama libertadora do 25 de Abril, continua acesa e gritar a plenos pulmões que O POVO UNIDO, JAMAIS SERÁ VENCIDO.

VIVA PORTUGUAL!

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

AS MINHAS MEMORIAS -O inesquecível Tio Libertário

O INESQUECÍVEL TIO LIBERTÁRIO
Durante o funcionamento da escola-paga da Dª Inês, a meio da manhã e a meio da tarde, havia o recreio, e quando o mesmo acontecia, aí íamos nós, Rua de Lisboa abaixo, até ao Serro do Moinho. Brincava
-se ao “apanhar”, faziam-se as necessidades fisiológicas, porque, casas de banho não as haviam. Eu ficava na casa de minha tia Maria Teresa, meia irmã de minha mãe. A minha tia vivia com muitas necessidades económicas, trabalhava no campo de sol a sol, enquanto o marido meu tio Libertário, trabalhava de oficial sapateiro, a principio na oficina do Sr. Garcia e mais tarde, quando aquela fechou as portas, por conta própria. Era  uma pessoa adorável, muito brincalhão a carinhoso com os filhos o Tó Zé e a Clarinha, mas também comigo a quem tratava como filho. Mas tinha um problema que era semelhante à maioria dos homens desta localidade – gostava do seu copito!.

E certa vez, minha tia chegou do trabalho, foi à Bica lavar uns trapos, trazer agua para casa – não havia agua canalizada, fez o jantar e como meu tio se demorava a vir, da taberna do Quedas, a meio da ladeira do Posto mandou-me ir chamá-lo para jantar. Eu fui a correr, cheguei lá e disse para meu tio:

-Tio, a tia diz para você vir jantar!

E ele, brincalhão, respondeu:

-Tá bem meu filho. Diz lá à tia, que vá migando as sopas que eu já levo o pão!

E eu voltei e fui, na minha inocência, transmitir o recado a minha Tia.

Noutra ocasião, estávamos a jantar e eu gostava muito de linguiça cozida. O meu tio, brincalhão como sempre, colocou-me no prato, algumas rodelas e, misturada com elas, uma malagueta. Claro que, sendo noite, à luz do candeeiro a petróleo – não havia electricidade, meti à boca a malagueta e o resultado foi o que se calcula. Mas ele não fazia isto por mal, era a forma de ser – brincalhão.

Quando, anos mais tarde, tive que ir para a guerra colonial, para a Guiné (de que falarei na altura própria), no dia em que me fui despedir da família, dormi em casa de minha tia, na rua do Cerradinho, hoje rua 1º de Maio. Meu tio, como habitualmente foi para a taberna e quando voltou, já vinha “grosso”. E então, ao lembrar-se que aquela seria provavelmente a última noite que ali pernoitava, visto nunca se saber se algum dia regressaria ou não com vida, desatou num choro alto, que acordou a vizinhança. E no pranto, não se cansava de dizer:

- Meu rico filho, que nunca mais o vejo!

Era assim o meu tio Libertário, muito alegre, muito sentimental, um coração do tamanho do mundo, um dos grandes amigos que tive e que jamais esquecerei.

AS MINHAS MEMÓRIAS- Quando fui para a Escola

QUANDO FUI PARA A ESCOLA

Antes de completar os sete anos, idade obrigatória para se ir para a escola oficial, minha mãe mandou-me para a “escola paga”. A “escola paga” era uma especíe de pré-escolar, onde as crianças aprendiam as primeiras letras. Aí sob a orientação da Dª Inês, aprendíamos a escrever em ardósias, a soletrar as primeiras palavras, de forma que, quando ingressássemos na oficial, já íamos instruídos. Grande Senhora foi a Dª Inês. Muito educada, com sentido de responsabilidade, ela ensinava as letras, mas também ensinava as crianças na sua educação. Falta a Alvalade, render homenagem póstuma a esta grande Senhora. A “ escola paga” também era conhecida pela “escola da Dª Inês” e funcionava na Rua de Lisboa( está por concretizar a homenagem pública à DªInês, que ensinou as primeiras letras a tantos alvaladenses). Pagava-se vinte e cinco tostões por semana, mas por vezes a Dª Inês fechava os olhos àqueles que por dificuldades económicas o não podiam fazer.

AS MINHAS MEMÓRIAS As Feiras em Alvalade -2

as Minhas Memórias

AS FEIRAS EM ALVALADE 

Logo de manhã, minha mãe, dava-me o banho, no alguidar grande de zinco e vestia-me a rigor. E depois de tomado o cavalo, o Morgado – um animal cinzento, lindo, que o Toino havia comprado por intermédio do Zé Rato – lá seguíamos na carrinha, a caminho da Vila, para a feira.

Gostaria de falar aqui um pouco do Morgado, porque também ele faz parte das minhas memórias. O Morgado era, como já referi, um lindo animal. Mas tinha um defeito. Quando menos se esperava “embicava” isto é faltava-lhe as forças nas pernas dianteiras e pumba, caía e muitas vezes caíamos nós também. Certa vez, poder-se-ia ter dado um grande desastre – o Morgado entendeu cair, precisamente numa passagem de nível, quando o comboio já assomava ao fundo da recta , junto ao Monte Novo. Conseguiu-se cortar os arreios a tempo. Também, no dia em que fiz o meu exame da 3ª classe, quando íamos a caminho da Vila, junto à Casa da Guarda da CP, o Morgado resolveu “embicar” e eu, que não ia seguro, passei pelo ar por cima dele e estatelei-me felizmente só com uns arranhões.

Outra mania do Morgado, é que gostava de competir com o comboio. Se seguíssemos numa estrada paralela à via férrea, quando o comboio por nós passasse, o Morgado lançava-se numa corrida doida, aos quatro, tentando o impossível – ultrapassar o comboio. O resultado é que, com esta mania, mais depressa chegávamos ao destino.

Mas voltemos aos dias de feira. Logo que chegávamos à estação da CP, se notava que os dias eram diferentes. As linhas férreas estavam completamente cheias de vagões, que serviriam para o transporte do gado comercializado na “ corredoura”.

A corredoura, como se chamava ao local onde se concentravam os rebanhos de ovelhas e cabras, as manadas de vacas e bois, as varas de porcos, situava-se à entrada da Vila, antecedida pelo acampamento da “ciganada”. Alvalade era na altura rodeada de extenso olival e era aí, no olival que se faziam os negócios de transação do gado. Na estrada da estação, os ciganos tentavam vender as suas mulas e burros, correndo com os mesmos para mostrarem que não coxeavam.

Depois, frente à Escola Primária, aí sim – começava a feira. Logo aí ficava o carrocel ou carroceis, porque por vezes era mais que um, mas geralmente o “Alegria” e o “Vieira”. Depois ao lado destes, o circo, geralmente o Cardinal, Na mesma zona as barracas do tiro ao alvo, ou as barracas das “meninas” como eram chamadas as prostitutas, onde depois do negócio de gados os comerciantes e lavradores se divertiam , entregavam ao prazer carnal e deixavam muitas vezes o resultado do negócio.

Também aí ficava instalado o Poço da Morte, ou o baloiço de roda.

A seguir as barracas de roupas, o pronto a vestir e a seguir as barracas de brinquedos e quinquilharias, seguidas das louças de barro, cadeiras de buinho, latoaria etc. Mesmo à entrada da feira, ficava sempre instalada a barraca das fotografias à la minuta. Aí se juntavam as famílias, que só se encontravam nos dias da feira, para tirarem os retratos e ficarem com uma recordação. Deixando o olival e entrando na Vila, situavam-se as barracas dos frutos secos, geralmente na posse de algarvios que aqui se deslocavam, para venderem os figos secos, as amêndoas, as nozes, as alfarrobas e miniaturas de animais feitas de figo. Os pais e mães para não cederem aos pedidos dos filhos, diziam: aquilo não presta, filho! Aquilo é amassado com o cu das algarvias!
Mais acima, já quase na entrada do Largo da República, eram as frutas. A mais procurada sem dúvida, eram as nêsperas. E recordo aqui o pregão das vendedeiras “ levem-na boa nêspera , meninas”, o que, naturalmente fazia corar as donzelas que passavam.
Entretanto e dado que nessa altura não havia abastecimento de agua, a mesma era vendida na feira pelos “aguadeiros”. Estes eram moradores da terra, que aproveitavam a ocasião para amealharem alguns patacos. O pregão também me ficou nos ouvidos: “agua fresca regalada, dois tostões é uma barrigada”. As crianças percorriam a feira procurando pessoas conhecidas, familiares ou não, pedindo “as feiras”. E logo após os tostões na mão, iam gastá-los nos pirolitos ou no torrão de Alicante.

A feira mudava Alvalade como da noite para o dia, Dezenas de comerciantes visitavam a localidade e o desenvolvimento notava-se nesses dias. As transações efetuadas durante a feira, eram festejadas à noite, nas taberna, uma delas a do Vitorino
Café ? apenas o do Vasco, onde se serviam galões e garotos de boa qualidade. Igualmente nas tabernas se faziam ouvir os melodiosos cantes alentejanos, porem, só até determinada hora, pois a GNR da altura não o permitia, por indicações do governo da época.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

SENTIDA HOMENAGEM À DRA IRENE DO CARMO ALEIXO

Recordo aqui, ao mesmo tempo que presto uma sentida homenagem a uma mulher com a qual convivi, no decurso da minha actividade profissional. Infelizmente deixou-nos em Setembro de 2010. Poucos falaram dela nessa ocasião, embora muitos tivessem beneficiado da sua actividade quando esteve à frente do Centro Regional de Segurança Social de Setúbal e cumulativamente do Governo Civil do nosso Distrito. Foi ela quem ordenou a criação dos Centros de Dia, nos concelhos do sul do distrito de Setúbal, para alem de outros equipamentos sociais, Desempenhou igualmente as funções de Comissária Regional da luta contra a Pobreza. Embora muito distante da minha ideologia, pelo que nao posso ser acusado de favoritismo politico. Falo da Dra Irendo Carmo Aleixo, Mais conhecida por Irene Aleixo. Militante do PSD, foi no então governo do Professor Cavaco Silva que exerceu aqueles cargos. Conhecida igualmente por “Pombinha”, dada a sua irreverência e a forma como directa e frontalmente atacava os assuntos mais melindrosos que afectavam o distrito. Por exemplo, quando foi assassinado um jovem, guarda dum estabelecimento nocturno, não hesitou e publicou um regulamento distrital que ordenava o encerramento de bares, discotecas etc. à uma hora da madrugada. Tal medida produziu tão grande descontentamento que teve de ser rapidamente anulada. Foi ela, que, aquando uma visita à Casa do Povo de Alvalade, quando eu desempenhava funções administrativas, e após ter assistido à encenação orientada por mim, de um Auto de Natal, com idosos, de imediato mandou reunir a Direcção de então e ordenou “Na Casa do Povo de Alvalade, não podem continuar dois funcionários, mas apenas um. A funcionária (X) fica em Alvalade, o Luís vai integrar a equipa da Acção Social de Santo André, desempenhando as funções de animador, pois já vi que tem o perfil necessário para tal. Naturalmente protestei, dizendo que, como funcionário mais antigo me achava com o direito de continuar em Alvalade. Respondeu que eu não iria sair de Alvalade. Ficava na Casa do Povo e iria a Santo André quando necessário e igualmente iria as instituições de idosos do concelho. E, para tal, a Segurança Social iria colocar á minha disposição uma viatura com senhas de combustível , para as minhas deslocações. E assim foi. Claro que a viatura foi sol de pouca duração. Mas, durante 14 anos, desempenhei aquelas funções, quase até a minha aposentação

Mas existe um episódio, que jamais esquecerei. A Dra. Irene Aleixo, numa visita que fez ao Centro de Dia de Alvalade, anunciou que iria dar à instituição, uma viatura de nove lugares ( a primeira carrinha que serviu o Centro de Dia). Mas depois da promessa feita, e na medida em que demorava a sua entrega, eu e o presidente da Direcção, Sr. Horácio Fonseca deslocámo-nos ao Governo Civil, afim de indagarmos sobre o atraso na vinda da viatura.

Após entrarmos no gabinete da governadora, de imediato nos transmitiu a seguinte ordem:

“os senhores têm que ir a S. Domingos, com utentes em tal data porque vai lá o primeiro-ministro Prof. Cavaco Silva”.

- Mas (retorqui) Sra. Governadora, nós vamos mas não temos transporte. Só se pedirmos a carrinha ao padeiro ( o saudoso Joaquim Rainha). Mas, a carrinha é para transportar pão e não pessoas, ainda vem a guarda republicana e multa-nos!

Resposta rápida da Governadora : - “ A GNR nesse dia não multa ninguém, tomara ela olhar pelos comunistas”

Respondi – Ora senhora Governadora, não se preocupe com isso, não vai haver problemas.

Resposta rápida da Dra. Irene Aleixo -. Bem, se você o diz lá o sabe!

E dirigindo-se ao gabinete ao lado, onde se encontrava a sua secretária, ordenou-lhe:

“Oh Beta, telefona aí ao comandante da guarda, que não multe a carrinha do padeiro de Alvalade”

Todos nós que presenciávamos a cena, fizemos um imenso esforço para suster o riso.

O certo é que, o Centro de Dia de Alvalade esteve presente na recepção ao Primeiro Ministro, na visita que efectuou na década de 80 à vizinha freguesia de S. Domingos.

Gratas recordações que guardarei para sempre. Costumo afirmar que profissionalmente foi a Dra. Irene Aleixo a única personagem politica que me deu valor. Anos mais tarde, outros, de outros quadrantes mais à esquerda, anularam as suas ordens e mandaram-me para Santo André, aonde durante um ano até à minha aposentação, tive que me deslocar de manhã bem cedo regressando a Alvalade ao fim da tarde.

Nesta sentida homenagem ,só posso desejar, que a Dra. Irene Aleixo descanse em paz, junto de Deus a quem ela tanto amava.



sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ETAPAS da VIDA actualidade responsab. associativas

                                    actualidade - responsabilidades associativas em Alvalade

ETAPAS da VIDA -35 anos -responsabilidades autarquicas Presid da Junta de freg de Alvalade

                                            35 anos - responsabilidades autárquicas em Alvalade

Etapas da vida - 28 anos - inico da activ na Casa do Povo de Alvalade

                                               28 anos - actividade profissional em Alvalade

ETAPAS DA VIDA -20 anos Serv. Militar Obrigatório

Aos 20 anos - Serviço Militar obrigatório

ETAPAS DA VIDA - 17 anos - em Almada a estudar na Emidio Navarro e a trab no Arsenal do Alfeite

                                                       17 anos - em Almada a trabalhatr

ETAPAS DA VIDA - 14 anos - estudar em Beja. Escola Ind. e Comerc.

                                                          14 anos - em Beja a estudar

ETAPAS DA VIDA - 7 anos - Ferias em Sines

                                                   Aos 7 anos - praia de Sines

ETAPAS DA VIDA - 5 anos com minha irmã

   




                                                         5 anos com irmã

ETAPAS DA VIDA - 6 anos- escola primária

6 anos

ETAPAS DA VIDA - 3 -4 anos-nos almargens

3-4 anos

domingo, 9 de janeiro de 2011

AS MINHAS MEMÓRIAS - 4 - Vida Militar - O Galho

CRÓNICAS DA VIDA MILITAR (4)



O GALHO
A vida militar foi de facto uma parte importante da vida de qualquer jovem, durante os anos da guerra colonial. Essa vivência deixou em nós marcas muito importantes e difíceis de esquecer, ou que jamais serão esquecidas. Muitas pessoas quando ouvem relatos dessa época, não dão importância aos factos e é assim que esta fase das nossas vidas é sistematicamente ignorada principalmente pela classe politica. Cabe-nos a nós antigos combatentes, não deixar cair no esquecimento os factos que marcaram o país, durante 13 anos, e que resultaram na morte de milhares de jovens, outros milhares de estropiados e vitimas do stress de guerra.

A vida dos jovens nos anos 60 e princípios de 70, foi terrivelmente marcada pela guerra colonial.

A tortura começava logo, na fase de incorporação e a seguir a instrução, que se resumia a preparar a “carne para canhão”. A instrução militar pautava-se por exerc+icios físicos extremamente difíceis, acompanhado por elevadas doses de acção psicológica, cujo fim mais não era que tornar justificável o que não tinha justificação: a guerra.

Um dos exerc+icios que nos incutia terror era sem sombra de dúvida o famoso “galho”. A partir de uma plataforma a vários metros do solo, o instruendo, deveria lançar-se e atingir um galho pendente de um poste a uma distância considerável. Se o instruendo tivesse o infortúnio de não conseguir atingir o “galho” a queda seria desastrosa e levava muitas vezes ao hospital. Mas, o terror do “galho” dissipava-se a partir do primeiro salto, se o mesmo fosse bem sucedido. Partir daí, tudo era mais fácil.

Mas temível era igualmente o pórtico, para além de outros exercícios difíceis de concretizar. A instrução pretendia criar nos jovens o espírito de revolta por isso eram humilhados constantemente durante a instrução militar.

Noutras crónicas irei relatando factos relacionados com esta fase da minha vida. Não colocando de parte outros episódios doutras fases da minha vida e desde que a memória me permita, relatar.