quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

AS MINHAS MEMÓRIAS do Monte ... para a cidade

Do Monte para …. A cidade!

Terminada que foi a instrução primária, depois de feito o exame da 4ª classe e depois o de admissão - penso que assim se chamava porque após ele, seria possível a admissão no ensino secundário- ao qual, naqueles tempos, nem todos tinham acesso. Nessa altura já minha irmã , mais velha três anos, se encontrava a estudar na Escola Industrial e Comercial de Beja ( hoje Escola Secundária D. Manuel I).

O exame de admissão foi feito em Santiago do Cacém, e para a sua realização era necessária a deslocação dos alunose familiares, bem como professores, para a sede de concelho. Lembro-me que ficámos hospedados numa casa particular, hoje inexistente, que se situava no inicio da rua que conduz ao antigo hospital Conde de Bracial. O próprio exame foi feito na escola primária existente nessa mesma rua e onde depois do 25 de Abril de 1974, existiu a sede do Partido Comunista Português.

Vieram depois as férias grandes e os preparativos para a minha ida para a grande cidade. Era esta uma das grandes mudanças da minha vida. Outras se lhe seguiram, que a seu tempo, se tiver vida, saúde e vontade de escrever, virão a lume.

As férias grandes foram, como sempre passadas no monte. Com os meus 9- 10 anos, naturalmente que as ocupações eram ainda as dum adolescente. Passeava pelas estradas de bicicleta a pedal, passava muito do meu tempo junto dos trabalhadores agrícolas , principalmente os que desenvolviam a sua actividade na lavra de milho existente na várzea dos Almargens e cuja exploração estava a cargo da IRPAL – Industrias Reunidas de Produtos para Alimentação, empresa cuja sede era em Sacavém. Lembro-me bem do grupo de gente jovem, ma maior parte mais velhos que eu, a minha irmã, a Teresa, que hoje vive em Lisboa, o Caixinha ( com quem hoje relembrei esses tempos) e outros mais que a memória não permite que fale neles. E lembrar, os banhos na ribeira ( ali chamada de S. Romão) mas que não é outra senão o Rio Sado. Recordo-me de, nessa altura, com a juventude própria das nossas idades, todos nós e outros mais, resolvemos ir nadar na ribeira. E na falta dos fatos de banho, as roupas interiores , serviram para evitar o nudismo. Foi grande a brincadeira no pego das Fontainhas. Eu, com o agravante de ter tido havia algum tempo uma grave doença que me afectou os pulmões. Mas isso não me impediu de entrar na “ramboia”

O pior foi à noite no regresso ao monte. Alguém teria ido contar a minha mãe, o espectáculo dos banhos públicos, onde eu, a minha irmã, e o restante grupo andamos a divertir-nos. Claro, que houve tareia, e que tareia!

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

ASMINHAS MEMORIAS - O Cante das Janeiras


   

AS TRADIÇÕES LIGADAS AO FIM DO ANO
O CANTE DAS JANEIRAS

Depois vinha o fim de ano e o dia de ano novo, era igualmente nalguns lares  comemorado com algumas iguarias alimentares, quando as havia. Uma tradição existia e que muitas vezes concorria para um almoço ou jantar melhorado; O CANTAR DAS JANEIRAS. Hoje fala-se muito no cante dos Reis, mas segundo as minhas memórias, na nossa região, cantavam-se os Reis, mas a tradição mais importante eram as Janeiras, até porque antecedia um dia de festa (dia de Ano Novo) havendo assim a hipótese de “rancho melhorado” no dia do novo ano. E, as Janeiras eram cantadas na noite de 31 de Dezembro para 1 de Janeiro. Grupos de homens e mulheres, protegidos do frio e da chuva, com xailes e mantas, percorriam as herdades , e aí chegados dirigiam-se à casa do lavrador ( aí sempre levavam a esmola - às vezes!)
Batiam à e perguntavam: “ Quer que cante ou que reze?”
Isto porque por vezes alguém na família podia estar doente, ou a família enlutada. Geralmente, de dentro, mandava-se cantar. E logo o “ponto” cantava:

“Oh senhora lavradora
Raminho de salsa crua

Aos pés da sua cama
Nasce o sol e põe-se a lua”

Esta casa está caiada
Esta rua está varrida
Moradores que nela moram
Deus lhes dê anos de vida

Esta casa está caiada
Por dentro, por fora não
Moradores que nela moram
Deus lhes dê a salvação

Esta casa cheira a rosas
Por dentro estão as roseiras
Onde há meninas bonitas
Onde há meninas solteiras

Esta rua está caiada
Esta rua está varrida
A mulher que é asseada
Pela rua é conhecida

Esta rua está caiada
Quem seria a caiadeira
Foi a mãe do meu amor
Com raminho de oliveira

E, quando na família havia alguém mais jovem, cantava-se:

Oh senhores lavradores
Deixem-se estar que estão bem
Mandem-nos dar a esmola
Pela flor que aí tem”

E logo depois, a porta se entreabria e se perguntava quem era o do “saco”. E lá ia a esmola - laranjas, toucinho, uma ou outra linguiça ou chouriço, pão e por vezes dinheiro.
Depois lá vinha o agradecimento, entoado pelas vozes melodiosas dos cantadores:


“Inda lhes canto mais esta
Em louvor de S. Mateus
A esmola que nos deram,
Seja por amor de Deus”


             Ou

Inda lhes canto mais esta
Em louvor de S., João
Deus lhes dê muitas venturas
Pela esmola que nos dão!

E o grupo lá desandava, muitas vezes debaixo de chuva ou enfrentando a geada, a caminho de outra herdade. Andavam-se por vezes mais de trinta quilómetros, dada a distância entre os montes, das herdades, inseridas no sistema de latifúndio do Alentejo.
Terminada a jornada, dividiam-se as ofertas pelo grupo e graças a elas, o almoço ou o jantar de ano novo, seria melhorado.

* Nota – As quadras incluídas no artigo, foram relembradas pelos utentes do Centro de Dia de Alvalade, que anualmente saem à rua não para cantar as janeiras, mas sim os Reis, na noite de 5 para 6 de Janeiro.



AS MINHAS MEMÓRIAS -Festas de Natal da infância

AS FESTAS DO NATAL NA MINHA INFÂNCIA



Gostaria, até porque estamos na quadra natalícia, de relembrar, como era o Natal da minha infância, bem como as datas a ele ligadas
O Natal da minha meninice, arrepia! E porquê? Porque vivia-se uma época de grande carestia, de muita fome e nada que se comparasse com aquilo que hoje se passa, em que apesar da crise, o consumismo continua a sobrepor-se a todas as situações de carência. Nesses tempos, a quadra natalícia era quase que ignorada, comparada com aquilo que hoje se passa. Amealhava-se uns cobres para, no dia de Natal se “estrear “ uma ou outra peça de vestuário. Outros, não se poderiam certamente dar a esses luxos. No dia de Natal, por vezes, quem vivia nas herdades, ia à capoeira, matava uma galinha ou um frango e o rancho era melhorado. Aliás, hoje é banal comer-se frango ou galinha, nos tempos antigos só se comiam em dias de festa, ou quando alguém estava doente. Doces? Que me lembre algumas famílias lá conseguiam uns ovos e faziam as fatias de ovos - pão em fatia, passado pela gema do ovo batido e colocado depois na frigideira. Seguidamente era polvilhado com açúcar, e era uma verdadeira delicia, acompanhado por café bem quente, feito na chocolateira de barro, na lareira. Na casa do lavrador, por vezes lá se faziam as filhoses, o que impregnava o ar, daquele cheiro característico a fritos.

Prendas no sapatinho???

Quando acontecia, nalgumas famílias, as crianças contentavam-se com duas ou três bolachas Maria, com uns figos secos ou umas bolotas numa “enfieira”. Noutras com algumas posses, apareciam as sombrinhas e os Pais Natal de chocolate. Geralmente nesse dia não se trabalhava nas herdades. Aliás as datas ligadas à religião eram, duma forma geral tidas em consideração pelos proprietários e lavradores, talvez por temor aos castigos divinos. Os trabalhadores, esses tinham que cumprir o feriado, embora não recebessem qualquer vencimento.