domingo, 8 de agosto de 2010

MINHAS MEMÓRIAS - MINHA AVÓ ERMELINDA

Ando com um dilema enorme . Tinha-me proposto a mim mesmo escrever e dar a conhecer as minhas memórias. Acho que, no inicio, mercê daquele desejo de colocar cá fora as recordações que nos acompanham, a tarefa não foi difícil. Mas com o passar do tempo, começa a falhar-me a memória dos factos passados. Quero escrever , mas, sinceramente faltam-me os motivos.

Alguém que me é muito querido, costuma dizer-me: “Então o passarinho perdeu o pio?” . Não quero que tal aconteça, porque a vida do ser humano é recheada de factores que nos acompanham para sempre e que merecem ser relatados. Pois , meus amigos e amigas, ainda há muito para vos relatar e como tal vou fazer um esforço, trazendo ao de cima, momentos, vivências e pessoas que de uma forma ou de outra contribuíram para a vida que vivemos.

E, assim hoje, vou relembrar uma pessoa pela qual nutro uma enorme saudade, a par de uma admiração pelo que foi enquanto pessoa. Trata-se da minha avó ERMELINDA.

A MINHA AVÓ MATERNA ERMELINDA

De seu nome Ermelinda, ou Ermelinda Júlia, Pereira Alves Ribeiro, nasceu no Porto na freguesia da Sé, mais própriamente na Rua do Loureiro, tendo vindo para Lisboa, com tenra idade. Seu pai ao que consta era industrial de barbearia, com diversos estabelecimentos do ramo, na baixa lisboeta. Igualmente e tanto quanto nos é dado saber, a família residia então numa casa perto da Loja das Meias, na rua da Prata.

É preciso ter em conta que a vida da minha querida avó Ermelinda foi e será sempre um enigma, dado que pouco se sabe da mesma. Sabemos , por aquilo que dizia, ter o 5º ano do Liceu Camões em Lisboa, o que para a época constituía alguém com uma certa cultura e conhecimentos. Ainda me lembro da forma como falava sobre ópera. Ela conhecia muitas das óperas e pelos vistos, na sua juventude assistia a espectáculos do género. Nunca soubemos, verdadeiramente a vida da nossa querida avó. Como veio parar ao Alentejo? O que concorreu para, sair de uma família de posses económicas, vir para o Alentejo e aí passar todas as vicissitudes?

Há muita coisa na vida desta mulher, que nunca se chegou a saber. Eu próprio tenho comigo muitas vivências que a mesma me contava, mas por respeito à sua memória, não as torno públicas.

Lembro-me, que estando eu no serviço militar em Lisboa, resolvi contactar o então director do jornal “O Século”, João Pereira da Rosa, e informar-me se poderia colocar naquele jornal um anuncio tentando saber o paradeiro de familiares. O senhor, recebeu-me no seu gabinete com toda a gentileza e disse-me que, o Século poderia publicar um anuncio, mas que era necessária a autorização da própria.

Daí, logo que tive oportunidade, falei com minha avó sobre o assunto. A resposta não se fez esperar: “Nunca, não autorizo, que faças uma coisa dessas”

E , a minha avó, que diariamente lia o jornal “ O Século”, embora com um dia de atraso ( era-lhe emprestado pelo comandante do posto da GNR de Alvalade), no dia seguinte à sua publicação. E, daí por diante o jornal era percorrido linha a linha, artigo a artigo, na tentativa de se aperceber de algum artigo consigo relacionado.

A minha querida Avó Ermelinda nunca chegou a anunciar à família( filhos) o paradeiro dos seus irmãos e outros familiares. Segundo consta, aquando da morte de seus pais, ao ser solicitado aos irmãos um inventário dos bens em testamento, o mesmo não condizia com aquilo que minha avó sabia existir. E, segundo consta, com algum orgulho optou por cortar relações com os irmãos abdicando da sua parte no testamento. Isto, aquilo que consta. A verdade? Nunca se soube.

Minha avó morreu pobre. Tinha 80 e tantos anos. Eu estava a trabalhar em Almada e recebi a informação da sua morte. Logo de seguida rumei a Alvalade. No funeral de minha avó, a pessoa a quem eu tanto admirava e respeitava pela sua cultura, pela sua bondade e carinho para com os familiares e especialmente os netos, não resisti e no cemitério chorei em voz alta, aquilo que só em casos raros o faço. Ainda hoje guardo comigo a memória da minha querida AVÓ ERMELINDA.

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