quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

ASMINHAS MEMORIAS - O Cante das Janeiras


   

AS TRADIÇÕES LIGADAS AO FIM DO ANO
O CANTE DAS JANEIRAS

Depois vinha o fim de ano e o dia de ano novo, era igualmente nalguns lares  comemorado com algumas iguarias alimentares, quando as havia. Uma tradição existia e que muitas vezes concorria para um almoço ou jantar melhorado; O CANTAR DAS JANEIRAS. Hoje fala-se muito no cante dos Reis, mas segundo as minhas memórias, na nossa região, cantavam-se os Reis, mas a tradição mais importante eram as Janeiras, até porque antecedia um dia de festa (dia de Ano Novo) havendo assim a hipótese de “rancho melhorado” no dia do novo ano. E, as Janeiras eram cantadas na noite de 31 de Dezembro para 1 de Janeiro. Grupos de homens e mulheres, protegidos do frio e da chuva, com xailes e mantas, percorriam as herdades , e aí chegados dirigiam-se à casa do lavrador ( aí sempre levavam a esmola - às vezes!)
Batiam à e perguntavam: “ Quer que cante ou que reze?”
Isto porque por vezes alguém na família podia estar doente, ou a família enlutada. Geralmente, de dentro, mandava-se cantar. E logo o “ponto” cantava:

“Oh senhora lavradora
Raminho de salsa crua

Aos pés da sua cama
Nasce o sol e põe-se a lua”

Esta casa está caiada
Esta rua está varrida
Moradores que nela moram
Deus lhes dê anos de vida

Esta casa está caiada
Por dentro, por fora não
Moradores que nela moram
Deus lhes dê a salvação

Esta casa cheira a rosas
Por dentro estão as roseiras
Onde há meninas bonitas
Onde há meninas solteiras

Esta rua está caiada
Esta rua está varrida
A mulher que é asseada
Pela rua é conhecida

Esta rua está caiada
Quem seria a caiadeira
Foi a mãe do meu amor
Com raminho de oliveira

E, quando na família havia alguém mais jovem, cantava-se:

Oh senhores lavradores
Deixem-se estar que estão bem
Mandem-nos dar a esmola
Pela flor que aí tem”

E logo depois, a porta se entreabria e se perguntava quem era o do “saco”. E lá ia a esmola - laranjas, toucinho, uma ou outra linguiça ou chouriço, pão e por vezes dinheiro.
Depois lá vinha o agradecimento, entoado pelas vozes melodiosas dos cantadores:


“Inda lhes canto mais esta
Em louvor de S. Mateus
A esmola que nos deram,
Seja por amor de Deus”


             Ou

Inda lhes canto mais esta
Em louvor de S., João
Deus lhes dê muitas venturas
Pela esmola que nos dão!

E o grupo lá desandava, muitas vezes debaixo de chuva ou enfrentando a geada, a caminho de outra herdade. Andavam-se por vezes mais de trinta quilómetros, dada a distância entre os montes, das herdades, inseridas no sistema de latifúndio do Alentejo.
Terminada a jornada, dividiam-se as ofertas pelo grupo e graças a elas, o almoço ou o jantar de ano novo, seria melhorado.

* Nota – As quadras incluídas no artigo, foram relembradas pelos utentes do Centro de Dia de Alvalade, que anualmente saem à rua não para cantar as janeiras, mas sim os Reis, na noite de 5 para 6 de Janeiro.



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